O aproximar desta quadra festiva inunda o espaço informativo de escritos e mensagens cheias de bonitas palavras e cenários idílicos que visam em muitos casos e conscientemente escamotear ou esconder a dura realidade subjacente.

  Vem isto a propósito dos muitos artigos e notícias recentes sobre o dito bom momento dos sectores industriais do calçado e da cortiça, como é conhecido predominantes aqui no Concelho, nomeadamente pelo aumento das exportações.    

  Quase se poderia dizer, tal como é repetido até à exaustão pelo primeiro ministro que estamos “no bom caminho“ quando mais nos afundamos, que à nossa escala se tenta pintar, também nestes sectores específicos, um quadro manifestamente cor-de-rosa e fantasioso.

  Isto porque esse pretenso crescimento das exportações nestas indústrias tem um claro reverso e consequências dramáticas que não podem nem devem ser esquecidas nem ignoradas. Ao menos por honestidade intelectual.

  Aliás, os números alarmantes do desemprego no Município feirense são a prova acabada disso mesmo. Dos cerca de 10 mil desempregados registados, e que na verdade se estima serem realmente o dobro, com todos os graves problemas humanos e sociais que lhe estão associados, uma grande percentagem provêm destes sectores industriais. Bastará citar o encerramento da Rohde, multi-nacional alemã do calçado, e que lançou no desemprego centenas de trabalhadores, cuja maioria apesar de todas as promessas de reinserção no mercado de trabalho e cursos de formação assim continuam. Mas muitas outras, de pequena e média dimensão, soçobraram nos últimos tempos sem apoios nem créditos.

   O sector corticeiro, porém, é ainda mais grave e emblemático do rumo para que nos estão a levar: desindustrialização acelerada, concentração da produção em grandes grupos monopolistas, à custa da maior exploração, do trabalho precário e mal pago, da asfixia de outras unidades industriais (Subercor, Vinocor, ICL e ICAL, só para citar as mais recentes).

   Fala-se agora muito na riqueza das matérias-primas, no valor intrínseco do sobreiro – ambiental, económico e social – para o progresso do pais e da região. Mas esquece-se no fundo, propositadamente ou talvez não, que a nossa maior riqueza reside no factor humano, na força do trabalho e é essa acima de tudo que devia ser defendida e valorizada.

 

 

Luís Quintino. 

Membro da DORAV do PCP