Índice do artigo

Intervenção de Lúcia Gomes, eleita da CDU, na Sessão Ordinária da Assembleia Municipal de Santa Maria da Feira de 30 de Abril de 2009.


Lúcia Gomes

Período antes da ordem do dia

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia Municipal

Exmo. Sr. Presidente da Câmara Municipal

Exmos. Senhores Vereadores

Exmas. Senhoras e Exmos. Senhores

Desde a última sessão desta Assembleia Municipal até Março, inscreveram-se mais 362 feirenses nos centros de emprego, totalizando 7677, 58% dos quais são mulheres. Em termos de variação homóloga, representa um crescimento de 30% em relação a Março de 2008.


No quadro do Distrito de Aveiro, que hoje apresenta profundas dificuldades e problemas sociais, Santa Maria da Feira vive hoje uma situação de grave crise económica e social, com destruição do seu aparelho produtivo e abusos sucessivos dos direitos dos trabalhadores.

A Corticeira Amorim, teve 6,15 milhões de euros de lucro em 2008, com as vendas do grupo a atingir 468,3 milhões de euros – um aumento de 3,2% face a 2007. Mas apesar dos contratos com o Governo em que se comprometeu a manter e criar postos de trabalho, tendo para isso recebido avultados fundos e isenções fiscais, em Fevereiro despediu 193 trabalhadores. Está agora a receber mais umas largas dezenas de milhões, conforme explicitou em visita recente o Primeiro-ministro. E foi para esta empresa que o PS pediu, em Abril de 2008, isenções fiscais.

A Ecco´Let, que depois de ter superado em 15% o volume de vendas previsto para 2008 e de ter recebido do Governo cerca de 4 milhões de Euros, e após ter despedido 369 trabalhadores, procedeu em final de Março ao despedimento colectivo de mais 180 e anuncia agora o despedimento de mais de 100 trabalhadores.

Cresce a utilização ilegal do lay off para continuar a produção, paga pelo erário público e a Segurança Social, diminuindo os salários dos trabalhadores e cresce a sua utilização recorrente e ilegítima, como na Facol, que tem vários meses de salários e subsídios em atraso e que até a ACT reconheceu não respeitar os direitos das trabalhadoras.

A Cifial anuncia lay off, a Champocork anuncia a redução de actividade, os micro, pequenos e médios empresários da cortiça têm o garrote do monopólio da cortiça liderado pelo Grupo Amorim, e por mais que PS e PSD se ponham em bicos de pés à conta dos cheques de Vieira da Silva e Manuel Pinho, são estes empresários os primeiros a dizer que estes apoios não são a solução.

Dizia Brecht que«Também o céu às vezes desmorona, e as estrelas caem sobre a terra (…) Isto pode ser amanhã.» Assim, é imprescindível e urgente que o Executivo exija medidas urgentes ao Governo de apoio ao distrito e ao concelho e tome, ele próprio, medidas urgentes com vista a minorar os impactos negativos de uma crise que tem vindo a ser agravada pelas medidas do Governo PS. Aliás, nem o FMI acredita nas medidas deste Governo, já que prevê o aumento do desemprego para 11% em 2010.

Este diagnóstico não pretende atribuir culpas ao Executivo mas chamar a atenção para uma tomada de posição e para a tomada de medidas urgentes no sentido da dinamização do tecido económico e de apoio aos desempregados feirenses, que não param de aumentar.

E desde já saudamos todos os trabalhadores e o 1º de Maio que simboliza todas as suas lutas e conquistas históricas, a conquista histórica das 8 horas de trabalho nos campos do Alentejo em que os camponeses saiam de noite para trabalhar e chegavam já de noite do trabalho, que em Maio de 1962 conquistaram o direito às 8 horas; as lutas de milhares de trabalhadores que morreram pela redução da jornada de trabalho, por melhores condições, pelas conquistas de Abril que hoje o Governo PS quer destruir.

Mas como dizia o poeta comunista Ary dos Santos «é preciso termos confiança. Se fizermos de Maio a nossa lança, isto vai meus amigos, isto vai».

Por outro lado gostaria de perceber as razões que justificam que, enquanto encerram serviços públicos e se degradam as condições de vida das populações, o Presidente da Câmara anuncia à imprensa, que em reunião com o Governo defendeu o encerramento de Unidades de Saúde Familiares para os equipamentos ficarem mais concentrados? Exactamente a quais se estava a referir?

Certamente terá o Sr. Presidente conhecimento das nefastas consequências nos tempos de espera dos utentes e nas listas de espera para consultas externas no Hospital S. Sebastião com o encerramento de urgências e unidades hospitalares. Dou o exemplo das listas de espera que nas consultas de gastrenterologia que supera 1 ano e há consultas a serem desmarcadas. Como pode então defender o encerramento de mais serviços públicos?

Finalmente informo que deixarei um requerimento escrito solicitando informações sobre as obras da escola de Chão do Monte que, por altura da visita de um deputado do PCP nos foi assegurado que as obras estariam concluídas até ao fim de 2008 e até hoje não o estão.
 

Lúcia Gomes


Relatório e Contas 2008

Exmo. Sr. Presidente da Assembleia Municipal

Exmo. Sr. Presidente da Câmara Municipal

Exmos. Senhores Vereadores

Exmas. Senhoras e Exmos. Senhores
 

É esta a sessão da assembleia em que somos chamados a pronunciar-nos sobre o mandato do executivo e avaliar a execução e o cumprimento de promessas.

Promessas muitas vezes vertidas em cartazes espalhados pelo município dando nota dos muitos milhões que se investem em projectos, nunca referindo a antiguidade histórica dessas promessas. Dizia o senhor Presidente da Câmara, a 21 de Março de 1988, em entrevista ao jornal Terras da Feira que «Como sabe o objectivo prioritário, que aliás é público, pois todos nós passamos a vida a falar nele, chama-se “saneamento básico”. Este é o grande problema, aquele que mais nos aflige, no concelho de Santa Maria da Feira. Todo o processo está em bom andamento, a própria obra está a andar, neste momento temos 900 mil contos de trabalhos adjudicados». Perguntava o jornalista se desta vez «às promessas vão suceder-se as realidades». Respondia o sr. Presidente «Sem dúvida que sim. Em termos muito gerais de como está o desenvolvimento do projecto do saneamento básico, a grande aposta da Câmara, aquela a que temos dispensado a maior atenção e que nos tem roubado mais tempo, posso dizer-lhe que está no bom caminho». O Sr. Presidente era, à data, como ainda é hoje, Alfredo Henriques, e o partido no poder o PSD.

E tão bom caminho era esse que, volvidos que estão 20 anos, o caminho não tem fim à vista. Mais ou menos como as obras na A1 entre Feira e Estarreja. Não há maneira de acabarem e nós continuamos a pagar portagem! O saneamento tem sido a eterna prioridade que parece não ter solução enquanto este Executivo se mantiver no poder. E se no Orçamento para 2008 se lia que “no início de 2008 verificar-se-á a entrada em funcionamento do sistema de saneamento básico das Bacias de Rio Maior, Silvalde, Beire e Antuã, o que permitirá a efectiva ligação à rede de uma parte significativa da população”, nada disto se concretizou.  

Aliás, lendo o Relatório de 2007, nesse ano concluiu-se o interceptor da Bacia de Aldriz e a reabilitação dos interceptores de Rio Maior, Silvalde e Beire. Lendo o Relatório de 2008, curiosamente, concluiu-se o interceptor da Bacia de Aldriz e a reabilitação dos interceptores de Rio Maior, Silvalde e Beire.

Também a Etar da Remolha veria as suas obras de ampliação em 2008. Previa-se, em 2008, o arranque da construção das Etar’s de Canedo e do Inha. Mais previsões que não passaram disso mesmo.

Em 2007 prometiam que 70% do saneamento estaria concluído em 3 anos e hoje, pergunto, qual é a taxa de execução do saneamento?

Depois desta sempre prioritária prioridade, passemos então a algumas considerações gerais sobre estes documentos. Antecipando já a argumentação de que a oposição critica e vota contra por ser esse o seu papel, desde já, a CDU demarca-se. E demarca-se com a honestidade, trabalho e competência que a caracteriza.

É inegável que temos e fazemos propostas, é inegável que sabemos do que falamos e que damos o nosso contributo para uma discussão séria sobre as matérias que interessam ao nosso município. E esse trabalho salda-se nas inúmeras moções aqui aprovadas e na inclusão de propostas da CDU na actividade do município, pese embora a dificuldade que o executivo tem em admitir que em muitas questões, a CDU tem efectivamente razão.

E depois deste “acerto de contas” é preciso acertar as contas.

Sr. Presidente

Srs. Membros da Assembleia Municipal

Nos documentos disponibilizados, nomeadamente na certificação legal de contas, é levantada uma reserva por limitação de âmbito que refere que «por insuficiência de respostas aos pedidos de confirmação externa que o Município, por nossa sugestão, solicitou, a que acrescem situações de contencioso e de facturas ainda em curso de apreciação e conferência, não validamos com a segurança planeada os saldos relativos [e sublinho] a instituições financeiras, empresas participadas e outros terceiros, e os respectivos efeitos na demonstração de resultados e no balanço». Significa isto, portanto, que relativamente a bancos, a participadas como é a Sociedade de Turismo S.A. [cujas contas deveriam, aliás, constar dos documentos uma vez que a participação da Câmara é de 51%], entre outras contas, há dados que poderão não estar devidamente contabilizados.  

Assim sendo, os rácios apresentados no relatório de gestão podem ser postos em causa se o passivo não é credível, nomeadamente o apuramento da situação de endividamento no final do trimestre, a própria demonstração de resultados, os indicadores financeiros e de rentabilidade, nomeadamente a solvabilidade total assim como a própria análise da situação económica e financeira.

Nessa medida, não obstante o grau de execução ser maior este ano comparativamente aos anos anteriores, como se impõe – vêm aí as 3 batalhas eleitorais – os dados que nos são apresentados não têm todos os elementos e o resultado líquido de cerca de 5 milhões de euros poderá não o ser, ferindo de uma dúvida razoável os dados que nos são apresentados.

E quanto às outras prioridades?

Em relação ao parque escolar, a Câmara Municipal (sempre PSD) assistiu passivamente à sua degradação, porque a sua intervenção tem sido muito insuficiente ao longo dos anos. E é bom lembrar que desde 1986 que é da competência das autarquias a construção e conservação do Parque Escolar do pré-escolar e 1º ciclo.

O estado actual de degradação não é mais do que o resultado desta incapacidade política em encarar a educação como uma prioridade de intervenção autárquica. O estado de degradação actual obriga a que se procure dar andamento rápido à construção dos centros escolares. Contudo, não se pode descurar a intervenção nas escolas existentes, uma vez que a conclusão dos centros escolares parece ainda não estar para breve e entretanto, as crianças têm de frequentar espaços pedagogicamente adequados e com as condições de segurança e salubridade exigidas. Os contentores que ainda permanecem no nosso município e que custam milhares de euros por ano, são um exemplo eloquente do que não deve ser um espaço educativo.

Se é verdade que está em marcha a renovação do parque escolar (aproveitando disponibilidade financeira existente para essa finalidade através do QREN), o que a Câmara está a fazer não é mais do que a sua obrigação e, mesmo assim, a um ritmo diferente do de outros municípios, onde já se avançou muito na reconversão do equipamento educativo, mesmo em municípios onde a degradação do parque escolar não estava, de forma nenhuma, tão avançada como no município feirense.

Exemplo cabal é a escola de Chão-do-Monte, que, por altura da visita de um deputado do PCP, nos foi assegurado que esta estaria concluída em 2008 Agora, afinal, parece que esta apenas estará concluída no final do ano lectivo. A ver vamos.

De sublinhar que neste Relatório se evidenciam outras situações preocupantes: é o facto de que nenhuma cobertura de amianto foi retirada, apesar do compromisso público do Executivo nesse sentido, é a constatação e que escolas continuam a não estar ligadas à rede de saneamento, nem mesmo para o aniversário das invasões francesas, como é o exemplo da escola de Arrifana que celebrará o seu 16º aniversário.

Em matéria ambiental, é pobre a execução orçamental como é pouco ambiciosa a política desenvolvida. Mais um ano sem solução ambientalmente viável para o tratamento dos resíduos sólidos e urbanos, mais um ano em que os esgotos vão para os rios, mais um ano em que nada foi feito, a não ser os famosos estudos, em relação às pedreiras desactivadas que continuam a constituir grave perigo para a saúde pública.

E já agora, onde está o Centro Coordenador de Transportes tantas vezes prometido e onde está o Auditório Multiusos de S. Paio de Oleiros, cujo projecto de arquitectura constava no Relatório de 2007 e em 2008 não há sequer vestígios do dito? E as obras no Parque da Nossa Senhora da Saúde, também em Oleiros, quando terão fim à vista?

Já quanto ao desenvolvimento económico, não posso deixar de citar o que vem dito no relatório, que se não fosse tão sério, quase seria caricatural. «Em 2008, mais do que uma mera expressão com um sentido algo vago, “a crise” mostrou existir de facto. E com essa crise são bem evidentes os seus reflexos negativos na nossa sociedade. As inúmeras dificuldades económicas por que passam as nossas empresas, o encerramento de algumas unidades industriais, a deslocalização de empresas que há já muitos anos faziam parte do nosso quotidiano e o desemprego são problemas que existem, efectivamente, no nosso município e que norteiam a nossa actuação já que a Câmara Municipal pode (e deve) desempenhar um importante papel na criação de sinergias várias que concorram para o fortalecimento do nosso tecido produtivo e socioeconómico.»

Pois estamos perante um problema ético milenar, que de Kant a David Hume, passando pelo ano 500 a.C e pelos escritos de Parménides chegamos à questão do ser e dever ser. Ao mesmo tempo que o Executivo afirma que pode e deve, não é. Não tem desempenhado qualquer papel na criação de «sinergias», seja qual for o significado de tal epíteto, no fortalecimento do tecido produtivo e socioeconómico. Além de recusar, no quotidiano, esse papel, este Município tem visto o seu aparelho produtivo a desaparecer, sem atrair uma única unidade de produção a este concelho.

Facol, Ecco, Rohde, Corticeira Amorim, Amorim e Irmãos, Champcork, Recor, Cifial – o patronato faz o que quer. E deixa os trabalhadores sem trabalho, sem rendimento, ao mesmo tempo que continua a absorver largos milhares de euros do erário público que a CDU nunca deixou de denunciar. E quando o Sr. Presidente da Câmara questiona qual a utilidade da sua presença em concentrações de trabalhadores, certamente, para estes homens e mulheres, a solidariedade do presidente da sua cidade, em paridade, ao lado deles nas suas lutas, não seria indiferente. Porque a luta por melhores condições de vida e de trabalho, é a luta pelo fortalecimento do tecido produtivo e socioeconómico. Quais são, pois, as medidas que o Executivo propõe? Quais as medidas para centenas de micro, pequenos e médios empresários, que à conta da política monopolista no sector corticeiro não conseguem escoar a sua produção? Que medidas de apoio aos 7677 feirenses inscritos no Centro de Emprego, além as anunciadas em matéria de acção social, que se referem a 2008 e não a 2009.

Também em 2008, ano de crise, aumentaram as receitas provindas dos impostos municipais. Só no IMI, a Câmara arrecadou mais cerca de 1 milhão de euros em relação a 2007, em taxas de execução que superam sempre os 100%. E também em 2008 subiu por duas vezes o preço da água e sobrecarregou os munícipes com mais taxas.

São estas as sinergias de uma Câmara que há muito já escolheu o seu lado. E esse não é, claramente, o lado daqueles que mais sofrem com os efeitos de uma crise económica e social sem precedentes, dos que se vêem privados do seu trabalho, dos que sobrevivem com pequenas pensões.

Mas, como dizia o poeta comunista Ary dos Santos, «passaremos adiante, com passo firme e seguro. O passado é já bastante, vamos passar ao futuro». E a CDU construirá esse futuro, ao lado de quem trabalha.